Acordou no dia trinta e um de dezembro com um propósito mal acertado. Queria poder parar de errar no ano novo. Olhou para os lados e tudo o que viu foi uma mesma decoração mal acabada, que por falta de dinheiro era obrigada a encarar. Trabalho, esse seria o primeiro item de sua lista imaginária do que queria cumprir. Envergonhava-se toda vez que ia ao banco buscar sua mesada, lhe parecia idiota a idéia de sair de casa e depender dos pais. E de fato era.
Ao tentar pensar na segunda, várias coisas lhe vieram ao mesmo tempo e tateou no criado mudo seu maço de cigarros. Há meses tentou parar de fumar, mas já havia desistido, uma vez que lhe era um vício e sabia que contra seus vícios, ela não podia. E também porque a nicotina lhe acalmava, normal. Tratou de não gastar linhas de sua lista imaginária com isso. Acendeu um cigarro. A fumaça fedorenta lhe fez lembrar suas noites de diversão e concluiu que sem seus amores de uma noite só não podia ficar, outro vício. Necessitava de uma porcentagem de vadiagem, não tinha uma explicação aparente pra isso e ao lembrar-se da infância na igreja, se julgava, mas só até o primeiro gole de uma bebida forte. Não podia contra suas vontades.
Acabando por se achar idiota, se rendeu. Não queria mais listas, nem mesmo trabalho – seu primeiro item. Refletiu sobre felicidade e por mais que quisesse mudar uma coisa aqui, outra ali, se via bem, era acomodada. Portanto decidiu que estaria disposta a errar quantas vezes fosse preciso, se como consequência tivesse a mesma vida do ano que estava por se acabar.
Cigarros, vadiagem, bebidas, falsos amores, falta do que fazer... Assim ela era feliz, assim ela queria o ano novo. E sem objeções feitas a si mesma, virou pro canto e viu um corpo lívido dormindo calmamente. Levantou-se, trocou-se e foi-se embora daquele motel de esquina.
Aquela era a vida dela, era o que ela queria, seja lá quantos anos pudessem se passar.
E toda noite, mesmo na virada, adentrava aquele bar, ali sim tinha um propósito bem definido. Cada noite com um nome diferente, naquela noite, Catrina, como o furacão.